Clássico da literatura britânica é um dos romances mais cultuados de todos os tempos.
Lançado originalmente em 1847 foi a primeira e única obra escrita por Emily Brontë, a segunda das três irmãs escritoras. Sua irmã mais velha Charlotte escreveu o também cultuado 'Jane Eyre' e a mais nova Anne escreveu 'O locatário de Wildfell Hall', entre outros.
Emily não chegou a viver para ver o sucesso de sua obra tendo falecido de tuberculose um ano depois de seu lançamento e poucos meses após completar 30 anos. Aliás, a tuberculose levou todas as 3 irmãs ainda muito jovens, Charlotte morreu aos 38 e Anne aos 29 anos.
Morro dos ventos uivantes não é uma história de amor, é uma obra sombria, com um tom amargo e triste durante todo o texto. Até por isso foi incompreendido na época de seu lançamento e não recebeu boas críticas. Na verdade esse é um erro muito comum relacionado à obra, Morro não é um romance e sim uma história sobre vingança.
A história é narrada pelo Sr. Lockwood que chega à Granja dos Tordos, propriedade locada por ele durante uma temporada. Sendo um homem da cidade, ele procura um local pacífico para descansar e apesar das lindas paisagens da região ele se depara com uma estranha “família”, cheia de mistérios.
Após uma visita a residência de seu locatário, o Sr. Heatcliff no Morro dos ventos uivantes, o Sr. Lockwood fica completamente intrigado com este e os demais moradores, que nada parecem ter em comum a não ser sua brutalidade, e no retorno à Granja convalecendo por conta de uma gripe, ele pede a sua governanta a Sra. Nelly que o distraia contando o que sabe sobre o Morro e seus moradores. Acontece que não só ela sabe muito, como viveu praticamente toda a vida em meio a essas pessoas e começa então sua longa e detalhada narração sobre os tristes acontecimentos dos últimos 30 anos:
O Sr. Earnshaw, proprietário original do Morro, de volta de uma viagem traz um garoto de provável origem cigana que ele batiza de Heathcliff. Órfão, privado da convivência com a sociedade civilizada, o garoto causa estranheza a todos os moradores da casa, especialmente ao filho do Sr. Earnshaw, Hindley, em quem nasce instantaneamente ódio, especialmente ao presenciar o favoritismo de seu pai em relação ao garoto. Diferente do irmão, não tarda para que Catherine, a filha mais nova do Sr. Earnshaw se encante com Heathcliff e passem a ser melhores e inseparáveis amigos.
Assim acompanhamos a vida dos dois, seus encontros e desencontros, seus sentimentos conflitantes de amor e ódio e as circunstâncias que levaram os dois a destinos tão trágicos envolvendo nisso duas famílias que terminam desgraçadas.
O mais interessante dessa obra e que talvez seja o fator que leva ao erro de rotulá-la como um romance, é que apesar de ter uma história de amor em seu enredo, o foco está em como as pessoas se relacionavam naquela época, especialmente as que viviam em lugares remotos como os narrados no livro e como esse relacionamento muitas vezes era preenchido por mal entendidos, meias palavras, sentimentos reprimidos levando a sofridos e desnecessários desencontros e, muitas vezes, a rancorosas vinganças como a dessa triste história.
O que muito me atrai e fascina em obras britânicas desse período, é observar como o fato de as pessoas serem tão reservadas e cheias de orgulho fazia com que muitas vezes perdessem a pessoa amada ou se metessem em situações e relacionamentos desagradáveis. É extremamente chocante pra mim me deparar com histórias em que por uma pessoa não explicitar que gosta da outra, esta terminar só e perder seu grande amor para uma outra que foi mais “capaz” de expressas seus sentimentos. Por que a vergonha de expressá-los sem ter certeza absoluta que será correspondido (meio difícil se pensar que naquela época não era de bom tom nem conversar sozinha com um homem) era muito maior que o medo de passar o resto da vida sozinho!
Mas isso nem soa tão absurdo se pararmos pra pensar que uma mulher que expressasse sentimentos a um homem e depois mudasse de idéia (tipo, percebesse que não gostava dele tanto assim) ficava mal falada!! Isso sem nem pegar na mão nem nada!
Talvez pela cultura brasileira ser diferente, por sermos mais expansivos e falantes (sem generalizar, mas o brasileiro em comparação com outros povos é bem comunicativo) seja tão difícil pra mim, mesmo me considerando uma pessoa tímida, entender como alguém pode perceber que está prestes a perder a pessoa amada e ainda assim não ter coragem de exteriorizar o que sente.
Em Morro isso é bem claro, mas talvez o mais marcante seja a brutalidade nas relações humanas, em como alguns personagens passam a vida sendo humilhados e desprezados, sem atenção ou amor e como isso as torna pessoas amargas, frias, desprovidas de quaisquer sentimentos que não os de vingança e assim capazes de grandes crueldades....e por isso tb preciso dizer que meu personagem favorito nesse livro incrível é o Hareton Earnshaw, que sendo um dos que mais teve a vida desgraçada, conseguiu manter um caráter, uma doçura e uma capacidade de amar e perdoar que são simplesmente admiráveis e prova de como o meio não faz a pessoa e como é possível sair uma pessoa honesta e amorosa de um lar despedaçado, sem valores ou amor.
Eu nem percebi que tinha tanto pra falar desse livro, conheço a história há muitos anos e adoro o filme (a versão de 1993, com Ralph Fiennes e Juliette Binoche), mas só agora li o texto original e na íntegra, e talvez o fato de ter visitado o interior da Inglaterra recentemente tenha me trazido recordações de seus campos belíssimos, vivenciando de forma profunda a leitura uma vez que Emily relata com detalhes essa paisagem tão única onde ela mesma também viveu.
Minha verdadeira e profunda admiração pela obra e sua autora se aflorou.
Para aqueles que assim como eu são/ficaram fascinados pela obra, vale a pena acessar um site (em inglês) que é um guia de leitura de Wuthering Heights:
http://www.wuthering-heights.co.uk/summary.htm
Simplesmente imperdível!
Muito boa sua análise, Gi. Indico aos interessados a música Wuthering Heights - Kate Bush. Fez muito sucesso nos anos 70-80 e lembra bem o clima sombrio e tempestuoso do livro. bjs
ResponderExcluirOlá Gi;
ResponderExcluirnão consegui achar teu post no Jane Austen em português- devo ter passado batido ou errei de site, me repassa o link.
Gosto muito deste livro, e também de algumas narrativas similares norte-americanas do autor Nathaniel Hawthorne (House of the Seven Gables, por exemplo...). Você conhece?
Esse romance poderia fazer parte de uma grande leva de temática mais lúgubre na literatura inglesa (como "Outra Volta do Parafuso", ou até o próprio "Drácula" do Bram Stoker), que eu aprecio ler, a combinação de romance com sobrenatural cai bem no meu gosto.
Abraços gaúchos!